sexta-feira, 27 de abril de 2012

Enxergando o óbvio


Nego enche a boca pra enfiar palavras em inglês em situações completamente desnecessárias. Gringo - que fala inglês bem melhor que a gente - vem ao Brasil e acha isso ridículo.

Professor sem-noção não tem a menor capacidade de dar uma boa aula e motivar seus alunos. E enche a boca pra falar que é Doutor.

Pessoas comuns escutam verdadeiros insultos, que a indústria fonográfica insiste em chamar de música. E acham isso ótimo. Alguns inclusive obrigam os outros a escutarem também, ao passarem com seus carros barulhentos.

Mídias divulgam conteúdo completamente enviesado, irrelevante, sem nada construtivo, carregado de preconceitos e deseducações. E ganham prêmios de responsabilidade social.

Nego se acha inovador repetindo o que dizem os caras A, B e C - caras que o cara renomado D garantiu que sabem o que estão falando.

Empresas consideram-se na vanguarda da tecnologia mundial porque sabem desenvolver sistemas de software, enquanto nego lá fora tá estudando e desenvolvendo as linguagens de programação que nem existem ainda, as plataformas que nem existem ainda, os conceitos abstratos que nem existem ainda.

Pesquisas científicas gastam milhões para descobrir coisas totalmente irrelevantes, inúteis ou óbvias. ("Cigarro faz mal", "Dormir bem faz bem", "Ser feliz é importante")

Nego escreve um livro tosco e bota mil estrelas em volta disso no currículo. Você vai ler o livro e acha um lixo. Você dá essa sua opinião pra alguém e a pessoa diz que você é que é chato.

Você conhece uma pessoa maravilhosamente competente que estudou numa faculdade particular, e outra pessoa incrivelmente imbecil que estudou numa renomada universidade pública. Essa última faz parte da elite intelectual do país e a primeira não.

Você tenta explicar alguma coisa que basta abrir os olhos para enxergar e é considerado herege porque a sua opinião diverge da opinião da maioria.


A cada dia que passa, três coisas acontecem comigo:
  1. fica mais óbvio pra mim o quão ridículo é tudo isso;
  2. tenho menos paciência com esse tipo de atitude;
  3. fica mais claro pra mim o quanto podemos, como humanidade, ser muito melhores do que isso.


Então, peço licença para parar de tentar enganar a mim mesmo e para dizer algumas coisas óbvias:

Que mania ridícula de usar estrangeirismos à toa.
Que mania ridícula de automaticamente se considerar inferior em tudo.
Que mania ridícula de achar que o que está escrito em livro é automaticamente verdade.
Que mania ridícula de agir de certas formas sem motivo nenhum, só porque "todo mundo sempre fez assim".
Que mania ridícula de valorizar coisas imbecis e discutir assuntos idiotas.
Que mania ridícula que homem tem de falar mal de mulher e mulher tem de falar mal de homem.
Que mania ridícula de achar que "ser desonestinho aqui rapidão" não tem problema nenhum.

(Como eu disse, ando sem paciência, então me desculpem a sinceridade :))

Acha que eu estou enganado? Dê argumentos.
Acha que eu sou maluco? Prove.
Discorda? Sustente uma opinião contrária.

Na boa? Estou de saco cheio de ser mal-visto, mal-interpretado e até considerado "alguém que não sabe o que está falando" por pessoas que nunca sequer pararam pra pensar nos assuntos sobre os quais eu reflito, analiso, discuto e estudo quase todos os dias da minha vida praticamente desde que eu nasci.

Para deixar claro: todas as minhas opiniões são muito bem fundamentadas. Elas têm como base conhecimentos em diversas áreas, sejam formais (computação, música, rádio) ou informais (didática, línguas, psicologia, filosofia), além do convívio constante com pessoas de diferentes áreas de atuação, religiões, origens e pontos de vista.

Isso não quer dizer que as minhas opiniões estejam sempre certas ou que você não possa ter opiniões diferentes. Só quer dizer que elas são válidas, e que outras opiniões também precisam estar fundamentadas. Não adianta dizer que algo não é válido sem explicar os porquês, apresentar uma alternativa ou no mínimo já ter refletido bastante sobre o assunto.

Se nem sempre eu pareço ter muita segurança no que estou falando, é pelo seguinte motivo: porque sei que ainda tenho muito o que aprender. Sei que posso mudar de opinião futuramente e sei que eu posso estar errado. Infelizmente, existe muita gente que se coloca como "aberto a discussão" e no fundo é cabeça-dura, só aceitando o que lhe convém e inventando maneiras de enganar a si mesmo ou de distorcer uma discussão.


Na boa? Se você quer ser inovador de verdade, renomado de verdade, respeitado de verdade, faça o seguinte:
  • Seja você mesmo. Olhe mais pra dentro do que pra fora.

  • Trabalhe no desenvolvimento do seu próprio senso crítico e aprenda a confiar nele. Ouça a todos, mas conclua por si mesmo.

  • Julgue as pessoas não por sua posição, título ou passado, e sim por sua coerência. Verifique se a pessoa vive o que diz, e se o que ela vive é uma coisa boa.

  • Aprenda a sentir as coisas. Existem conhecimentos que você tem duas formas de adquirir: 1) estudar durante 30 anos aplicando modelos estatísticos que comprovem cada detalhe cientificamente; 2) perceber a verdade em minutos apenas com sua intuição.

  • Livre-se dos preconceitos - de todos os que conseguir. Faça-se sempre as seguintes perguntas: 1) Sou eu mesmo que acredito nisso ou eu apenas fui ensinado a acreditar? 2) Eu já acreditei nisso um dia, mas será mesmo que eu ainda acredito hoje?

  • Cerque-se de boas influências. Conheça pessoas inspiradoras, ouça músicas inspiradoras, veja filmes inspiradores, leia histórias inspiradoras. Não me refiro necessariamente a obras motivacionais. Qualquer excelente trabalho é uma excelente fonte de inspiração.


Termino citando este texto, simples e direto, com o qual concordo plenamente, de um site que descobri hoje, o http://www.serprofessoruniversitario.pro.br/:
O Professor Universitário no Brasil é um amador e não um profissional da Educação. Pois em nenhum momento de sua carreira lhe é exigido, ou mesmo facilitado, que adquira conhecimentos e habilidades de Pedagogia e Didática.

As políticas públicas e a legislação sempre enfatizaram como exigência para o acesso à carreira o domínio e profundidade dos conhecimentos na área e matéria que irá ensinar.

Os poucos professores que adquirem essas habilidades e conhecimentos o fazem somente por interesse e iniciativa própria, e assim mesmo tendo que ultrapassar barreiras institucionais até mesmo para reconhecer as qualificações obtidas.


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